Quando Voce Não Sabe o Que Dizer ou Fazer

 


Voce já experimentou aquela sensação inquietante de impotência, aqueles momentos na vida em que simplesmente não se sabe o que dizer ou fazer. Pode acontecer em uma conversa, na escrita ou até diante de uma decisão.  É quando você procura profundamente dentro da mente por pensamentos, ideias, qualquer coisa para compartilhar, mas tudo o que encontra é silêncio. Não importa o quanto tente; a imaginação permanece em branco, como se uma pesada cortina tivesse sido puxada sobre a sua criatividade.

No início, você diz a si mesmo que é temporário, que a qualquer momento algo vai surgir. Mas quanto mais isso demora, mais a frustração aumenta. O vazio começa a se espalhar, ocupando todo o espaço mental onde palavras e imagens deveriam viver. Você continua tentando encontrar algo para dizer, mas o vácuo só se aprofunda.

Esse silêncio começa a parecer pesado, até deprimente, como se a sua capacidade de criar tivesse desaparecido silenciosamente. Você começa a se perguntar se é mais do que uma simples falha momentânea.  O pensamento pode ser mais paralisante do que o próprio silêncio.

Então, a voz prática dentro de você fala: Deve haver uma solução para isso. Você imagina que sua mente deveria ter um plano para momentos assim, uma espécie de “lista como fazer” . Talvez o passo um fosse relaxar, o passo dois fazer um brainstorm, o passo três começar. Mas, na prática, nada dessa lista imaginária funciona. A página em branco encara você de volta, muda e imóvel, enquanto você fica suspenso entre o pensamento e a expressão, esperando a inspiração voltar.

Em um desses momentos, decidi parar de forçar. Peguei um livro que havia começado a ler alguns dias antes: A Sabedoria da Insegurança, de Alan W. Watts. Não tinha intenção de usá-lo para “resolver” meu bloqueio mental; eu só queria me distrair da frustração. Mas, enquanto lia, algo inesperado aconteceu.

Watts explorava a relação entre a consciência e a natureza, descrevendo-as não como entidades separadas em conflito, mas como dois aspectos da mesma realidade. Essa perspectiva, em sua profundidade e simplicidade, prendeu minha atenção. Nem sequer estava diretamente relacionada ao que eu vinha tentando escrever. Mas foi o suficiente para despertar minha mente.

De repente, as ideias começaram a se mover, timidamente no início, depois em um fluxo constante. Passei a fazer uma lista de vários tópicos sobre os quais eu poderia escrever ou conversar. Eles surgiam quase rápido demais, como se uma porta tivesse sido aberta e pensamentos que esperavam pacientemente do outro lado corressem todos de uma vez.

Meu estado de espírito mudou quase instantaneamente. Momentos antes, eu estava frustrada e desanimada; agora me sentia esperançosa e cheia de energia. A pergunta já não era mais O que posso dizer? mas sim Qual dessas ideias devo escolher?

Essa mudança repentina me deixou curiosa sobre a seletividade da mente. Como a leitura de apenas duas páginas sobre um assunto não relacionado ao meu objetivo original poderia gerar centenas de possíveis ideias? Por que meu cérebro liberaria criatividade em uma direção quando eu vinha forçando tanto em outra?

Percebi que, muitas vezes, a criatividade resiste à força. Quando nos pressionamos a produzir, às vezes estreitamos o espaço onde as ideias podem surgir. É como se a nossa mente consciente se tornasse um guardião severo, não deixando passar nada porque está obcecada em encontrar “a coisa certa”. Mas, quando nos afastamos, o subconsciente fica livre para trabalhar sem supervisão, criando conexões e acendendo ideias vindas de lugares inesperados.

No meu caso, parei de me preocupar com a página em branco e me permiti desfrutar de um livro. Esse simples ato de mudar o foco liberou minha mente para devanear. As novas ideias não tinham relação direta com o que eu lia, mas de alguma forma a leitura abriu o portão. Não foi o conteúdo em si, mas a mudança no estado mental que fez diferença.

Há uma lição silenciosa nisso: a inspiração nem sempre é encontrada olhando fixamente para o problema. Às vezes, ela vem ao mudarmos totalmente o foco, dando à mente espaço para se alongar. Uma caminhada, uma conversa, uma música ou um capítulo de um livro podem despertar a criatividade com mais eficácia do que horas de esforço concentrado.

Ainda enfrento momentos em que meus pensamentos ficam em branco. Mas agora, em vez de entrar em pânico, tenho uma estratégia. Sei que me afastar não é desistir; é convidar as ideias a chegarem no seu próprio tempo. Solto a necessidade de forçar as palavras e me volto para algo que me envolva de outra forma. Na maioria das vezes, as ideias voltam  muitas vezes mais ricas e variadas do que antes.

Aquele dia com Alan Watts me lembrou que a criatividade é menos como uma torneira que se abre e fecha e mais como uma maré que vai e vem. Não é possível ordená-la a subir em determinado horário, mas podemos nos preparar para estar prontos quando ela vier. Às vezes, a melhor maneira de preencher uma página em branco é parar de encará-la.

 

 

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